quarta-feira, 17 de abril de 2013

ERA UMA VEZ...



Era uma vez, um homem e uma mulher. Eles se conheceram, descobriram suas diferenças e aproximaram suas semelhanças. Eles sorriam juntos, choravam juntos e,  quando era briga, só um brigava. Eles ouviam música juntos,  dançavam, namoravam, e, de vez em quando faziam algumas pequenas viagens, juntos. Conversavam muito sobre tudo. Tudo era muito. Tomavam café juntos, almoçavam juntos, caminhavam juntos e, até tomavam banho juntos. E, de vez em quando, dormiam juntos ,também. Eles assistiam TV juntos, compravam CD pirata juntos, iam a farmácia juntos e até fazer exame em um consultório médico, juntos. Saiam para se divertir, comer, beber, dançar... Tudo junto! Juntos eles conversavam sobre qualquer assunto e sempre tinha assunto para mais uma conversa quando estavam juntos. Quando ficavam em silencio, ficavam em silencio juntos, geralmente ficam em silencia apenas quando estavam dormindo juntos. Juntos eles “seguraram a barra” um do outro, se fizeram companhia e foram solidários. Eram como pão com manteiga, café com leite e arroz com feijão. Diferentes que se completam. Juntos eles falavam da vida, da infância, da família e das conquistas. De vez em quando eles celebravam com vinho, juntos. Eles juntavam tudo. E tudo que acontecia fora deles pouco importava quando estavam juntos. O tempo parava quando estavam juntos. Quando eles não ficaram mais juntos eles choraram dias. E então... O fim da história? Eles se separaram, cada um foi cuidar de sua vida. Alguma surpresa? ELES  FORAM FELIZES PARA SEMPRE, SEPARADOS, NÃO JUNTOS  porque essa é uma história REAL, NÃO UM CONTO DE FADAS.

terça-feira, 16 de abril de 2013

DOAÇÃO


DOAÇÃO

 

Querido Augusto,

 

Sempre me cobrastes palavras afetuosas como prova de meu amor por ti. Não basta ofertar a ti meu riso, minha alegria, meu viço e meus dedicados atos de cuidado. Isso sempre foi pouco. O que mais poderia dar a ti? E o que mais poderia eu receber de ti? Senão dar a si mesmo e receber o outro de presente. Essa é a maravilha de amar. Mas meus afetos possuem o silêncio que minha inquieta língua não tem. Dou a ti as minhas lembranças, os meus suspiros noturnos, meu olhar perdido e a mente vaga das manhãs sem você. Dou a você a minha saudade, porque é tudo que tenho. Gostaria de ter esperança, mas sei que ela não existe. Dou a ti a imagem do meu melhor vestido, o olor do meu melhor perfume. Dedico a ti os vinhos que sirvo a mim mesma no jantar. Dou a ti a saudade que tenho a cada luz de vela que acendo no cair da noite, as flores que planto no meu jardim. Dou a você as músicas que ouço. No mais dou a ti a lágrima que derramo às escondidas, dou a ti o meu silêncio e o desejo que sejas feliz, hoje e sempre. A ti, que tanto afirmara eu não ser romântica, a ti mais que a qualquer outro Augusto, dou o que tenho de mais íntimo e mais nobre: a minha poesia.

 

Catarina.

 

O SAPATO APERTADO


O SAPATO APERTADO


Há alguns dias não escrevo. Quase nenhuma postagem e nenhum texto no meu blog. É tanta coisa fluindo de dentro para fora e tão pouco espaço para o escape que não resisti, voltei a minha “terapia da letra”. Sim, escrever é o bálsamo para quando não há ouvidos generosos o bastante para me ouvir. E, confesso, tenho muita falta deles. Mesmo aquelas pessoas que tentam me demonstrar algum afeto, mesmo estas,  nunca me poupam de eventualmente me dizerem que falo muito. Eu sei que falo muito. Esse é meu pecado mortal. Devo estar condenada a solidão eterna por isso e jamais terei meu lugar no céu, assim como não há na terra. Não há lugar na terra para pessoas falantes como eu, de certo. Já ensaiei “curas” para esta doença. Já fingi que não tinha nada a dizer. Sou tão ruim para mentiras, que sempre souberam que eu tinha algo a dizer, e, que pensava algo sobre o assunto. Eu falo muito sim, faço aqui a “mea-culpa”, meu ato de contrição. Eu não apenas falo muito. Eu penso muito, eu perscruto muito, eu investigo muito, eu vejo muito, eu sinto muito. Às vezes tenho a impressão que meu “universo particular” é maior do que o externo. Que a roupa é menor que o corpo e que o sapato está constantemente apertado. Sim, é assim que eu me sinto na maioria das vezes. Eu penso coisas diferentes da maioria das pessoas com quem convivo. Eu gosto de vinho, a maioria gosta de cerveja. Eu gosto de gastronomia enquanto a maioria acha isso uma bobagem. Meu maior desencanto é tentar preparar um bacalhau a gomes de sá, para quem acha que é frescura e calcula que o dinheiro gasto naquele jantar poderia comer em um “rodízio de churrasco” ou em um “rodízio de pizza”. Gosto de filmes antigos que me levam a reflexões sobre outras épocas outros padrões que nos antecederam e que às vezes muito nos influenciaram enquanto a maioria ao meu redor acha que estes filmes são ultrapassados demais. Filmes bons mesmo são aqueles cheios de barulho, efeitos especiais e beldades hollywoodianas. Eu gosto de música com boas letras, de música clássica, de orquestra de câmara, gosto do Yanny, Andre Rieu, Sarah Brigthman. Gosto de tudo isso, e, como uma ilha, estou rodeada por sertanejos dançantes, leks-leks, tchu, e coisas do gênero. Eu até me divirto com a maioria destas coisas, conheço-as, contemplo o mundo que me cerca, provo de tudo o que é “comível”, mas é brutal pra mim o desdém às coisas que gosto, ou as conversas interrompidas porque são “papo-cabeça” demais. Com algumas pessoas, aquelas que possuem ouvidos quase que beatificados, eu tento me fazer entender. Na maioria das vezes, em vão. Pois algumas delas, mesmo que com alguma polidez me dissuadem a mudar de assunto. Tenho necessidade de pares compatíveis. Talvez minha mente tenha acumulado coisas demais, livros demais, conceitos demais, pesquisas demais. É o sapato apertado. A mim, me parece que estou sempre usando um sapato apertado. Aquele que você precisa usar diariamente, mas que nos machuca, e tudo o que queremos e chegar em casa à noite e tirá-lo do pé. Nessa alegoria, a minha casa é a minha “caverna”, é meu universo, e a solidão é o ouvido sagrado. O lugar onde o mundo que eu criei é do meu tamanho ou maior. Costumo dizer que minha casa é a “Ilha da Fantasia”, o “Castelo dos Sonhos” a fuga para dentro de mim mesma. Lá eu tenho e leio livros, eu cozinho, na maioria das vezes para mim mesma, sem ter que precisar implorar para que me acompanhem numa iguaria culinária. Sento á mesa sozinha, abro um vinho e sirvo minha própria taça. Tomo meu banho e uso meu perfume predileto. Sim, esse é o meu mundo, onde o sapato não me aperta. Onde tudo é confortável e singelo. Assim como alguns gostam de tomar banho debaixo de pontes em rios de águas turvas, assim como os cantantes sertanejos embalam a alma de muitos, e que o guisado da dona coisinha é o melhor, e isso produz prazer, da mesma forma eu tenho os meus prazeres, com pouca compreensão da maioria das pessoas que me cercam, estou sempre calçando um sapato apertado. Tenho a sensação de que o que eu penso da vida, das coisas, de tudo, parece desinteressante. Tenho tentado diminuir meus compartilhamentos. Confesso que, com muito esforço tenho tentado quase sempre nunca falar do que sei. Tenho exercitado, fingido às vezes, não saber, nunca ter ouvido falar, para ter algumas companhias de vez em quando. É o sapato emprestado. É usar aquilo que não é seu. Mas também não dura muito, pois dia após dia tenho que usar o sapato apertado do armário. O único par que tenho.